O Airbnb, que surgiu como uma proposta inovadora de economia colaborativa, rapidamente se transformou em uma força disruptiva — e, para muitos, predatória — nos mercados imobiliário e de hotelaria. O que era apenas uma ideia simples, alugar um quarto vago para turistas, se tornou um negócio global que hoje está no centro de uma disputa complexa entre moradores, governos e o setor turístico.
Na linha de frente dessa reação estão países como Itália e Espanha, onde cidades historicamente turísticas, como Florença, Barcelona, Veneza e Madrid, impõem restrições rigorosas — e, em alguns casos, proibições — à atuação do Airbnb em áreas específicas. O motivo é claro: a explosão de imóveis voltados exclusivamente para locações de curta duração tem gerado desequilíbrios urbanos significativos.
Bairros antes residenciais estão sendo esvaziados de moradores fixos para dar lugar a uma circulação constante de turistas. Isso pressiona o mercado, reduz a oferta de moradias, eleva os preços dos aluguéis e aumenta a insegurança. “Você não sabe mais quem são seus vizinhos. Cada semana é uma pessoa diferente, o prédio virou hotel”, relatou um morador da região central de Barcelona à imprensa local.
No Brasil, o fenômeno segue trajetória semelhante. Cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife já sentem o impacto. Proprietários veem nas diárias do Airbnb uma oportunidade mais lucrativa do que nos contratos tradicionais. Com isso, retiram imóveis do mercado de locação residencial, agravando a escassez de moradia e pressionando famílias em busca de estabilidade.
Além da especulação, a questão da segurança preocupa. Crescem os casos de golpes aplicados por falsos locatários. Um exemplo emblemático ocorreu no bairro da Vila Andrade, em São Paulo, quando uma quadrilha usou uma reserva temporária para invadir e assaltar quatro apartamentos no mesmo prédio. “Eles se apresentaram como turistas, mas já tinham o plano armado. Entraram e limparam as unidades vizinhas”, contou uma moradora.
A tensão chegou ao campo jurídico. Em dezembro de 2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o direito de condomínios residenciais proibirem o aluguel via Airbnb, desde que a convenção preveja uso exclusivamente residencial. “Mesmo sendo dono do imóvel, o morador precisa respeitar as regras coletivas”, afirmou um dos ministros.
Além disso, discute-se a possibilidade de reforma no Código Civil brasileiro. Entre os temas em debate, está a regulamentação das locações por temporada. O objetivo é equilibrar o direito à propriedade com o direito à moradia e à harmonia urbana. A tendência é uma reconfiguração da plataforma: mais regras, necessidade de licenciamento e uma integração real ao planejamento urbano.
Com menos imóveis destinados à moradia, os aluguéis sobem, os moradores são empurrados para periferias e os centros urbanos perdem diversidade. Mas limitar o Airbnb também traz desafios, especialmente em cidades como o Rio de Janeiro, onde o turismo movimenta a economia. Muitos proprietários hoje dependem da renda gerada pelas locações temporárias.
A resposta, segundo especialistas, não está em proibir o Airbnb, mas em reorganizá-lo. “É urgente encontrar um equilíbrio entre turismo, propriedade privada e o direito à cidade”, defende uma urbanista da USP. A crise trazida pelo Airbnb é, ao mesmo tempo, um alerta e uma chance de rever políticas públicas e diretrizes urbanas.
O Airbnb já transformou o mundo. Agora, é o mundo que precisa transformar o Airbnb.
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Informações retiradas de Renata Firpo a Veja